Em um setor tão competitivo e desafiador quanto o transporte coletivo urbano, cada decisão operacional impacta diretamente na sustentabilidade do negócio. E, ao analisar a estrutura de custos de uma empresa de transporte, percebemos que o combustível ocupa a segunda maior despesa, perdendo apenas para a folha de pagamento.
Sendo assim, diante desse cenário, reduzir o consumo de combustível deixou de ser apenas um desejo e passou a ser uma meta estratégica crucial para garantir competitividade e saúde financeira.
Foi exatamente nesse contexto que, ainda em 2017, iniciamos uma mudança profunda em nossa operação: a incorporação da tecnologia de telemetria à gestão da frota. Afinal, antes disso, trabalhávamos praticamente “no escuro”.
As análises de desempenho dos motoristas eram baseadas em percepções subjetivas e relatos individuais e em conversas com os operadores, era comum ouvir que “todos dirigiam bem”, mas sem dados concretos, nem mesmo o próprio motorista sabia onde estava errando, o que impedia qualquer avanço real.
Precisando manter a empresa viva e competitiva, buscamos uma solução que trouxesse visibilidade operacional e inteligência de dados e, em parceria com uma empresa especializada, implantamos o sistema de telemetria em toda a frota.
O processo
Na primeira fase, optamos por não divulgar aos motoristas que o sistema já estava ativo: nosso objetivo era realizar um verdadeiro raio-X da operação, identificando comportamentos e padrões de condução que impactavam diretamente o consumo e o desgaste dos veículos.
Esse diagnóstico inicial foi fundamental para definirmos o “ponto de partida” e traçarmos estratégias consistentes para alcançar nosso principal objetivo: gerar economia de combustível sem comprometer a qualidade do serviço.
Um passo fundamental nessa jornada foi a definição dos eventos que seriam monitorados e a criação de parâmetros claros para cada um deles. É essa etapa que direciona toda a gestão: isso porque, sem parâmetros bem definidos, não há como medir desempenho nem conduzir a equipe rumo aos melhores resultados.
Além disso, também foi essencial montar um time de orientadores, instrutores e controladores capacitados e engajados, pois a experiência mostrou que a ferramenta sozinha não resolve nada sem gestão ativa e presença constante no processo. Com as bases estruturadas, partimos então para a capacitação dos motoristas e a aplicação do ciclo PDCA (Planejar, Executar, Checar e Agir), ajustando continuamente as estratégias conforme os resultados apareciam.
Definição de estratégia e foco: a importância da meta crucialmente importante
Um dos maiores erros ao iniciar um projeto de telemetria é tentar atacar todas as ocorrências ao mesmo tempo. A experiência nos mostrou que a estratégia mais eficaz é definir prioridades, escolhendo eventos que têm impacto direto no resultado desejado, no nosso caso, a redução do consumo de combustível.
Para estruturar essa abordagem, aplicamos a metodologia das 4 Disciplinas da Execução (4DX), que orienta a transformação de estratégias em resultados concretos. De forma resumida, as quatro disciplinas consistem em:
- 1. Focar no que é crucialmente importante – definir uma Meta Crucialmente Importante (MCI) que tenha impacto direto no objetivo central do projeto;
- 2. Atuar sobre medidas de direção – identificar indicadores que possam ser monitorados e influenciados diretamente pelas ações da equipe;
- 3. Manter um placar envolvente – criar uma forma clara e visual de acompanhar o desempenho, permitindo que todos saibam se estão avançando ou retrocedendo;
- 4. Criar cadência de responsabilização – estabelecer ciclos de acompanhamento, revisão e correção, garantindo que o time se comprometa continuamente com a meta.
No nosso projeto, aplicamos essas disciplinas definindo como Meta Crucialmente Importante (MCI) a redução das ocorrências do evento “pedal do acelerador”, pois a forma como o motorista acelera impacta diretamente o consumo de diesel. A partir daí, desenhamos estratégias de acompanhamento, treinamento e feedback contínuo, garantindo que cada ação estivesse alinhada com o objetivo maior: reduzir o consumo de combustível e melhorar a eficiência operacional da frota.
Capacitação de operadores
A etapa de capacitação é muito importante para alcançar os resultados. Para isso, saber por onde começar é fundamental. Afinal, uma vez com a telemetria instalada na frota, o gestor precisa identificar o grupo de operadores com o maior número de ocorrências no evento escolhido como MCI. No nosso projeto, percebemos que 53% de todas as ocorrências do evento de pedal do acelerador estavam concentradas em apenas 22% do quadro de motoristas, e foi essa turma a primeira a ser capacitada e acompanhada.
Durante a capacitação, é essencial que o gestor transmita aos operadores que a telemetria é uma ferramenta de apoio, projetada para ajudá-los em seu desenvolvimento e torná-los motoristas ainda mais capacitados. Essa abordagem permitiu uma mudança significativa na postura dos operadores e gerou um engajamento crescente com o projeto, criando uma base sólida para os resultados posteriores.
Resultados consolidados
Uma vez definida a estratégia de trabalho que envolveu a criação dos eventos, definição de parâmetros, definição da MCI, formação do time responsável pelo projeto e a capacitação dos motoristas, chegou o momento mais importante: avaliar os resultados.
Com o projeto bem estruturado, conseguimos uma melhoria média de 7,1% no consumo de combustível em relação ao início do projeto. Mas nosso objetivo de evolução contínua não parou por aí.
Em 2025, lançamos um novo desafio: reduzir ainda mais o evento de pedal do acelerador em 30% ao longo de 23 semanas. Restando apenas quatro semanas para a conclusão dessa etapa, já atingimos uma redução de 13,81% nessa ocorrência, o que se traduziu em ganho adicional de 1,61% na média de consumo de combustível. Ao final dessa etapa, novas metas serão implantadas, sempre com foco na melhoria contínua!
Além da economia de combustível, a mudança de comportamento gerada pelo projeto vem proporcionando reduções significativas no custo por quilômetro ao longo do ciclo de vida dos equipamentos, reforçando a eficiência operacional e a sustentabilidade da frota.
Conclusão: Tecnologia + gestão = resultados reais
Como vimos, a nossa experiência comprova que a telemetria, quando utilizada de forma estratégica e integrada a uma gestão ativa, tem o poder de transformar completamente a operação de uma frota. Afinal, não se trata apenas de instalar um sistema, mas de criar um ecossistema de gestão inteligente: com equipe engajada, parâmetros bem definidos e metas claras.
Mais do que reduzir custos, esse tipo de projeto promove mudanças culturais profundas, melhora o desempenho dos operadores, aumenta a segurança e eleva a eficiência operacional a patamares antes inimagináveis.
A tecnologia é, sim, a base dessa transformação, mas é a gestão consciente e estratégica que faz com que cada dado coletado se converta em resultados reais.